O muro branco
O maior medo que eles tinham era uma revolução de preto. Aí construíram o muro branco.
VITÓRIA DO POVO
Alexandre Flach
12/23/20243 min read
O Brasil naquela época tava na mão de uma das oligarquias burguesas mais experientes do mundo na parte de contenção social.
Primeiro, que o Brasil já tinha nascido como empresa, lá nos 1500, na invasão, e demorou mais de 500 anos pro povo perceber que “brasileiro” é profissão, não nacionalidade.
Claro que o povo escravizado tentava de tudo que é revolta pela sua libertação. Os dom pedro sofreram na mão desse povo!
E quando a gente estava na beira de conseguir deixar a escravidão pra trás - pelo menos a escravidão declarada - eles tiveram uma ideia realmente de gênio. O kaô seria o de “embraquecer a raça” brasileira, mas na real construíram o apartheid social mais inteligente, eu acho, de toda a história da humanidade: trazer os pobres da Europa pra concorrer com preto daqui. Gênio! Europeu pobre ia se criar aqui como uma elite da pobreza e esconder atrás dela os verdadeiros donos da empresa Brasil! Deu super certo! O racismo no Brasil ganhou um exército de milhões de brancos paga-paus de europeu e abriu um abismo entre o povo explorado e a meia dúzia de superexploradores brasilianos (porque pra eles, nascer no Brasil não é profissão que nem pra nós).
Até aquela coisa de colonizador, de que os branquinho europeu tinham que catequizar os índio ignorante, esses pobre europeu assumiram até o tutano! Mas isso atrasou demais as coisas aqui, pessoal, nossa senhora!
Pra não falar dos caras que não tinham vergonha nenhuma de dizer que tinham nojo de pobre (na verdade, de preto), os próprios movimentos sociais, marxistas, comunistas, anarquistas, sindicalistas etc etc pegaram as ideias jesuítas de catequeses e mandaram ver outras tantas maneiras de colonização. O lance era conscientar, politizar, educar, e por aí vai, “o povo” (preto, favelado e adjacensas). Seja pro capitalismo, pro socialismo, pro sindicalismo, pro puta-que-o-pario-ismo… não interessa: o pessoal aqui é burro e a gente que fazer alguma coisa por eles.
Aí, de um dia pro outro aquele povo que tinha feito Canudos, balaiada, sabinada, que tinha conquistado sua liberdade sequestrando família de senhor de engenho, de barão de café, de fazenda em fazenda, pra soltar os pretos, aquele povo foda que só não conseguiu fazer do Brasil uma república de preto por causa do tamanhinho que esse país tem, virou uma massa ignorante que tinha que ser ajudada pelos branquinho europeu que tinha acabado de chegar nas nossas quebrada e já se achavam os dono da bola.
O povo não sabe votar, não sabe falar, não sabe se comportar, e mal educado, é grosso, fala palavrão, é burro e cai na mão de pastor, de fascista, vira pobre de direita porque é trouxa, não se mobiliza, não entende de política, não sabe ler nem escrever, é feio, não sabe se vestir, só sabe roubar, beber cachaça e fumar crack, é machista, violento, não tem memória, enfim, é lixo humano guardado nas quebrada mais perigosas do planeta, lugar horrível que a gente tem que manter distância porque é mais perigoso que o inferno e só tem bandido.
Demorou muito pra gente se livrar desse muro branco do apartheid brasileiro, tão bem construído que até pra enxergar foi tempo, viu. A gente via branco querendo aumentar a “representatividade” dos preto na sociedade deles. Uma brigaiada danada entre eles lá. Pra nós, isso não valia nada. A gente nem sabia bem do que eles tavam falando. Claro que eles achavam que a nossa indiferença fosse porque a gente não tava ligado na coisa, tava alienado como sempre. Mas é que pra nós adiantava muito pouco ter uma preta em um cargo importante deles enquanto toda a estrutura da sociedade continuava igual e fodendo com a gente de tudo que é jeito. Pra mim, essa era uma briguinha deles mais pra pra melhorar o lixo de sociedade que eles mantinham do que pra ajudar a gente mesmo. Era coisa que dava uma de avançadinho mas na real era só mais um teatro pra branquinho manter tudo igual.
Pretejar o Estado deles era só o outro lado de branquear a nossa vida no Brasil.